Vinte um de novembro é uma data que me envolve em emoções mistas. Por um lado, recorda-me minha identidade religiosa, os percursos de devoção e a construção sedimentar de minha fé; por outro, traz-me nostalgia e melancolia. Explico.
Nesse dia, desde muito novo, criança ainda nos primeiros passos, era acordado durante a noite e levado à Pedra do Rosário. Meu pai, dirigindo um automóvel com múltiplos assentos, passava em peregrinação em vários locais, colhendo pessoas com o mesmo destino. Ao chegarmos, os bancos plásticos e de madeira eram dispostos no chão irregular, ladeados por uma mochila com garrafa de café, fatias de bolo, pipoca de milho e pães com queijo.
Esforçava-me para conseguir ver o palco/altar, erguia-me ao máximo na ponta dos pés, tentando ultrapassar a muralha de fiéis. Não conseguia, mas... ouvia e sentia.
Os anos foram se passando e fui conseguindo ver cada vez um pouco mais, até que ali pelos meus 13 anos, com alegria, consegui, pela primeira vez, plenamente enxergar a chegada da imagem da bela senhora.
No momento em que meus olhos fitaram-na, um dos marinheiros que a erguia desmaiou, a imagem cambaleou e uma série de homens e mulheres correram para conter a queda. Saiu ilesa.
Na minha alegria em vê-la, percebi aquele balançar como se a bela senhora estivesse acenando para mim. E assim se seguiu.
Perto da benção final, todos os anos, pedia ajuda para algo no ano vindouro; depois passei a agradecer o anterior e pedir pelo próximo, de modo que as provisões e desejos típicos da virada do ano eram feitos por mim nessa data.
Não sabia nada sobre a apresentação de Maria ao Templo nem entendia os significados teológicos e litúrgicos do que se rememorava naquele dia, mas o que sabia?
Sabia que ali se juntavam pessoas de diferentes crenças, católicos engajados, claro, mas - o que me chamou atenção na maturidade - ali se juntava uma parcela significativa de pobres, marginalizados, renegados, esquecidos e os odiados por legalistas e rigoristas. Para além da válida e importante beleza litúrgica vista no Altar, às margens estava a essência do povo de Deus. Muitas vezes machucado e mutilado, mas que estava lá em comunhão em busca da proteção maternal e dos cuidados de Deus.
Neste ano, não estive presente na alvorada, mas guardo o agradecimento e a prece dentro do peito.
Mãe da Apresentação, Virgem Senhora, Mulher vestida de sol, olhai por TODOS os filhos teus.
21 11 2024
César Porpino