Em um extremo conubardo, afastado dos centros, os ricos dispõem seus mortos, distantes de sua vista, acessados por caminho estreito e com chão selado por grama verde tachada por placas regulares e metódicas. Na periferia da metrópole, os muros disformes, ladeados por lixo a céu aberto e animais abandonados, abriga o repouso dos que creram ou não no Senhor Bom Pastor. Enquanto na primeira realidade, lenços, flores, brancos com óculos escuros perambulavam com passos acelerados, sem velas ou orações vocais; na outra, as experiências sensoriais me foram mais intensas. Alguns eram estruturados suntuosamente, mas sujos, sem flores, sem parafina queimando, esquecidos; outros extremamente limpos, mas rachados e rompidos em todas suas extremidades, expondo o conteúdo interior e exalando o odor fétido; aos montes, sem nomes e com imagens antigas; noutros, sem fotografias, mas com nomes persistentes; alguns eram simples, com sobras de madeiras presas em pregos de tamanhos distint...
Qual o exato momento em que se rompe a configuração da mente? Em que ponto o eu é quebrado? Para quem essas perguntas fizer sentido, inegavelmente, as respostas serão produto indivualizado, mas é interessante pensar nisso. Conta-se que Nietzsche, já acometido por repercussões neurológicas da sífilis, ao presenciar um cavalo sendo brutalmente violentado, entrou em desespero, repreendeu o monstro, abraçou o animal, chorou e entrou num estado de silêncio, isolamento e perda das habilidades sociais. Algo se rompeu naquele momento. [Ajoelhar-se diante do algoz e pedir por uma migalha e entregar-se por inteiro ao vazio nominável: a perda da dignidade + o colapso do amor por si = morte em vida] Certas esferas, quando quebradas, jamais serão consertadas, não há discurso, intervenção, medicamento ou seja lá o que for que possa ser indicado como solução. O que fazer? Bem, vícios podem surgir como tentativa de preencher a ferida, mas também sementes podem ser postas ali, na esperança ...